Cansadas de serem praticamente invisíveis nas reuniões do "board" da empresa, duas executivas decidiram que iriam ser notadas a qualquer custo. Um dia entraram na sala, depois que todos já estavam acomodados, com trajes absolutamente idênticos (conjunto de saia e blusa "bordeaux"). Para surpresa da dupla, apenas um dos executivos notou a brincadeira e começou a rir. Os demais demoraram a perceber a graça. A mensagem bem humorada, no entanto, funcionou e a partir daí a relação das executivas com o grupo de diretores melhorou. Suas opiniões passaram a serem ouvidas por todos os membros e com a devida atenção.
O relato acima é de Graça Bernardes, diretora de marketing da 3Com do Brasil. Ela acredita que o humor é uma arma inteligente que pode ajudar a mulher a vencer preconceitos no trabalho. Graça é uma das 12O executivas, que de próprio punho, contaram um pouco da sua experiência profissional no livro "Mulheres que Abrem Passagem", do consultor e escritor Júlio Lobos.
Ao longo de oito meses, Lobos entrevistou essas profissionais e depois pediu para que elas mesmas descrevessem suas percepções sobre a condição da mulher no trabalho. "Algumas, num primeiro momento, se sentiram incomodadas ao ter que falar sobre preconceito, algo que às vezes preferem ignorar, mas depois refletiram melhor e colaboraram", diz Lobos, PhD pela Cornell University.
O que chamou a atenção do escritor, que em 146 páginas faz um apanhado de informações gerais sobre a mulher recorrendo a uma vasta bibliografia sociológica, filosófica e administrativa, é que em todos os depoimentos as executivas parecem bem conscientes de que vivem o melhor momento para suas carreiras.
Em uma época onde os talentos gerenciais femininos estão em alta nos discursos dos gurus da administração, essas mulheres acreditam que estão levando vantagem no mercado, pelo menos, aparentemente, explica Lobos. Na prática, a realidade da mulher executiva ainda não é ideal. Em todo o mundo, elas ocupam pouco mais de 10% dos cargos mais importantes. No Brasil, a situação não é diferente, diz o consultor. Mas, por outro lado, elas estão abrindo caminho cada vez mais rápido.
Algumas das pioneiras que participaram do livro, reconhecem que tiveram que formular estratégias pessoais para lidar com as barreiras invisíveis na empresa. Chieko Aoki, presidente do Blue Tree Hotels, foi uma que buscou uma alternativa para ter seu ponto de vista levado em conta no início da carreira. "Ao expor idéias em reuniões, eu sentia que, por simples vaidade, o público masculino não as avaliava objetivamente... adotei, assim, uma estratégia diferente. Passei primeiro a "vender" a idéia a um homem do grupo com quem tinha maior afinidade", conta. Com esta tática, aos poucos, foi ganhando espaço e ouvidos.
Saber lidar com o universo masculino das empresas, pode significar também dosar a flexibilidade e o talento para atuar em equipe, qualidades gerenciais atribuídas às mulheres, com um certo tom de agressividade mais típico dos homens. "É a capacidade de mostrar-se agressiva quando oportuno", diz Deborah Stern Veitas, diretora vice-presidente Corporate e Investment Banking do BNP Paribas Brasil.
Muitas executivas confessam que tiveram que endurecer para lidar com um universo predominantemente masculino. "Eu poderia ter sido menos exigente, mais tolerante, menos perfeccionista, mais flexível, mais light", escreve Anna Maria Chimeri Battaglia, ex-diretora de Pesquisa & Desenvolvimento e Sistema da Qualidade da Santista Alimentos.
Para chegar lá, a maioria admite que foi preciso se preparar e trabalhar mais que os colegas. "Tive que trabalhar o dobro para me impor como diretora", diz Cristina Ricciardi Brisighelo, da Cêramica Atlas. Ariane Schwindt Campos Seixas, gerente de marketing da Bayer, conta que fez MBA e estudou várias línguas. "Se queremos competir profissionalmente, temos que utilizar as mesmas armas dos homens e usar o que temos de diferencial", diz.
A maior dificuldade para as executivas, no entanto, é exercer os diversos papéis atribuídos à mulher. Cláudia Costin, atual CEO da Promon Intelligens, ex-ministra da Administração, diz que quando trabalhava no governo estadual paulista, dava aulas à noite e ainda cuidava da família, sentia duas fortes pressões. "De um lado, ser excelente profissional a despeito de ser mulher; e de outro, ser excelente mãe e companheira...a despeito de ser profissional. Tentei ser ótima nos três papéis. Hoje sei que era impossível: ninguém é supermulher", escreve.
O eterno dilema da maternidade é um assunto recorrente na carreira das executivas. "Os homens, parece, têm idéias bem definidas do que uma mulher com filhos pode fazer, e não pode fazer, na vida, no trabalho...", diz Julia Lennox, diretora de Health Care, Mercosul, da Pfizer/Warner Lambert.
Não existem fórmulas ou segredos revelados pelas executivas no livro. Para Vania Ferro, ex-CEO da 3Com do Brasil, o importante para chegar lá foi nunca ter tido medo. "Chame isso de audácia, atrevimento, ou cara-de-pau, como quiser", diz. Para a ex-ministra da Indústria do Comércio e do Turismo, Dorothea Werneck, atual diretora executiva da Apex, o conceito de progredir profissionalmente para as mulheres, significa antes de tudo sentir-se feliz. "Isso envolve paciência para transformar o que estamos fazendo hoje. Humildade para reconhecer que, em certos casos, "não vai dar". E uma grande propensão ao risco, para um dia dizer "Chega! Vou embora, procurar algo novo".
"Mulheres que Abrem Passagem", De Júlio Lobos. Instituto de Qualidade (287 págs, R$ 28).
Camila Sampaio
sábado, 24 de novembro de 2007
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